Loveandpizza.it – Um Romance Em Napoli (Parte 7)
~ Ercolano ~
Fevereiro chegou, Lisa e eu já nos sentíamos mais confiantes quanto à preparação das aulas e achamos que estava na hora de começar a passear. O clima estava ótimo, não estava mais tão frio, então planejamos de visitar as ruínas da cidade de Ercolano. Nossa, eu mal podia esperar. Não conseguia acreditar que iria visitar um lugar tão antigo, que tinha estudado na escola. Um lugar que presenciou uma enorme tragédia quando o Vesúvio entrou em erupção em 79 d.C. e matou tanta gente. Algumas pessoas nem mesmo tiveram tempo de perceber o que estava acontecendo.
Para pegar o trem para Ercolano, tínhamos de ir até a estação central, na Piazza Garibaldi. A estação central tem linhas de trem e metrô, então pegamos um metrô de Chiaiano a Museo, depois andamos até Cavour e pegamos o trem para Garibaldi.
‘Credo! Que lugar horrível! Quanta imundice… e cheira a xixi’, Lisa sussurrou a última parte.
Eu concordei com ela. Eu já tinha lido sobre isso e, outro dia, passamos por um lugar onde africanos vendiam mercadorias falsas. Alguns dos meus alunos falavam que Nápoles era considerada uma cidade de terceiro mundo na Europa.
‘Eu sei. Também li sobre isso no meu guia. Lá descreve a estação central como uma área muito degradada da cidade, com muitos contrabandistas. Você está vendo o que esses caras estão vendendo? Relógios, bolsas, lenços e tudo o mais. Li ainda, na Internet, que eles são ilegais e que trabalham para a Camorra.’, comentei.
‘Camorra? Não é a máfia de Nápoles?’, se espantou Lisa.
‘Sim. Eu me pergunto onde e em que condições todas essas pessoas vivem. Não acho que elas ganham muito dinheiro vendendo essas coisas.’
Lisa olhou o seu guia e controlou o monitor com os horários dos trens.
‘Bem, aqui está dizendo que temos que pegar o trem para Torre Annunziata e parar na estação Ercolano Scavi. As ruínas não ficam longe de lá.’
‘Ótimo. Então vamos. Estou na dúvida sobre qual bilhete devemos usar. Você tem certeza de que não podemos usar o nosso passe mensal?’
‘Tenho, eu verifiquei. Ele não engloba viagens longas. Temos que comprar uma passagem para Ercolano.’
Fomos à bilheteria e lá descobrimos uma excursão para Pompéia que incluía uma caminhada até a cratera do Vesúvio. Ficamos animadas e decidimos que essa seria a nossa próxima aventura.
O trem que pegamos parava em todas as estações, estava lotado e demorou uma eternidade para chegar. Descobrimos depois que havíamos pegado um trem Regionale.
‘Bom’, disse Lisa, ‘o que deveríamos esperar? É sábado e estamos indo visitar uma atração turística mundialmente conhecida.’
Ela meio que falou sozinha. Eu estava a quilômetros de distância. O Vesúvio podia ser visto da nossa janela. A cada curva, lá estava: o imponente e maldoso gigante, com todo o seu esplendor. Eu não conseguia tirar os olhos dele nem por um minuto. Tentei imaginar a vida das pessoas que viviam ao seu redor e que, de certa maneira, haviam sido traídas por ele e pelos deuses da época.
‘Carolina?’
Lisa estalou os dedos na minha cara.
‘Carolina? Terra para Carolina.’
‘Aff, Lisa. O que é?’
‘Ei, calma aí. Caramba! Nossa estação é a próxima.’
Fiquei envergonhada.
‘Ah tá! Desculpa, Lisa. Estou muito empolgada.’
‘Você? Empolgada? Nem acredito.’ Ela me deu uma cotovelada, mostrando a língua.
Logo chegamos a Scavi, o local das escavações, e fomos comprar nossos ingressos.
‘Que legal! Que ótimo que tiramos a nossa carteirinha internacional de professores. Olha só, é o primeiro lugar que visitamos e o que economizamos aqui quase já cobriu a taxa da carteirinha! Ah! Eu amo Nápoles’, disse ela, sorrindo e caminhando em direção à entrada do local.
Essa carteirinha, realmente, foi uma grande descoberta. Para cada ingresso conseguimos 50% de desconto. Ah! Eu amo Nápoles, pensei, sorrindo e andando rápido para alcançá-la.
Não sabia bem o que esperar. Sabia que iria ver coisas antigas e ruínas. Tinha uma vaga lembrança das minhas aulas de história na 4ª série do Teresa Valsé, mas isso era tudo. Bem, considerando o preço que pagamos pelo ingresso, recebemos muito mais do que pagamos. Jamais esperei pelo que vi.
O lugar era muito maior do que eu imaginava para um logo de escavação. Sem mencionar o quanto era preservado. Tínhamos nossos audioguias – aqueles, tipo walkie-talkies – e estávamos prontas para começar. Paramos só mais um minuto para olharmos os mapas que nos deram na bilheteria.
‘Então, se a gente se perder, nos encontramos aqui neste café, daqui a umas duas horas? Esse lugar é enorme’, disse Lisa enquanto me mostrava o café em seu mapa.
‘Combinado. Tire muitas fotos, para que possamos trocá-las mais tarde. Até depois!’ Mandei um beijo e caminhei em direção ao número quarenta e um, a Casa dell’Albergo. Ela continuou estudando o mapa.
Estava tão maravilhada que nem esperei por ela. Estava totalmente imersa naquele lugar. Na minha cabeça via uma cidade habitada, dinâmica. Podia imaginar as pessoas circulando por seus negócios, cachorros, cavalos e carros convivendo naquelas ruazinhas irregulares, a entrada de um bordel, homens em bares, mulheres carregando panelas de comida para suas casas.
Andei pelos lugares verificando os números das atrações, os nomes das ruas e pressionando os números correspondentes no meu audioguia. Também toquei em todos os muros pelos quais passei, afinal, não é todo dia que podemos colocar as mãos em paredes com quase três mil anos, não é mesmo?
Ouvi as descrições dos edifícios, de todos os mosaicos, dos cômodos das casas e de quem morava nelas. Foi dentro de uma delas, uma que tinha um pátio enorme com uma macieira no meio, que tomei a decisão de um dia morar em uma casa onde todas as portas deem para um quintal. Duvido que seja algo fácil de se encontrar no Brasil, a menos que eu a construa, mas não me importa. Quero uma “casa em forma de U”, sem janelas para a rua e com um pátio no meio.
Ouvindo o guia, descobri que Ercolano não foi tão afetada pela erupção quanto Pompéia. Ela ficou toda coberta pelas cinzas, por isso ficou tão bem preservada. Caramba! Quem poderia imaginar, que em um dia qualquer, enquanto estava lá, passeando, cuidando de seus próprios negócios, conversando com seus amigos, tirando uma soneca ou apenas beijando seu amado à beira-mar, se ouviria uma enorme explosão e que, de repente, chegaria uma nuvem maciça, escurecendo os céus como se fosse o fim do mundo, espalhando cinzas por toda a cidade? Que as pessoas começariam a se sufocar, a tentar se esconder ou a se proteger e a proteger seus entes queridos entre braços e abraços? Acho que em um primeiro momento as pessoas não tiveram noção do que estava acontecendo. Acho que muitas nem tentaram escapar.
O audioguia dizia que durante as escavações nos anos 1990, eles haviam encontrado esqueletos de vítimas que haviam buscado proteção na praia, debaixo dos pórticos na antiga orla de Ercolano. Me cortou o coração ao ouvir aquilo.
Depois de andar pelas ruínas, procurei uma área sombreada e me sentei. Enquanto tomava goles da minha água, olhei para ele. Coisa assustadora. Ouvi um dos guias turísticos dizendo a um grupo que, mesmo após a erupção, as pessoas ainda vivem no sopé do vulcão. Mesmo que outra erupção possa acontecer a qualquer momento. Por quê? Por causa da terra que é extremamente fértil na área. Eu me perguntei o que aconteceria se o vulcão entrasse em erupção naquela hora, enquanto estávamos lá, olhando para ele, falando sobre ele. O guia também disse ao grupo que a última erupção do Vesúvio foi em 1944. Eu não sabia.
Fiquei fascinada. O olhava como se estivesse hipnotizada. Queria conhecer mais. Eu precisava chegar perto dele. Isso iria acontecer em breve, dali duas semanas, quando combinamos de ir para Pompéia. Encontrei a Lisa logo depois, ela também estava impressionada com o lugar. Saímos de lá e procuramos algo para comer. Encontramos uma pequena pizzaria e, claro, pedimos nossas Margheritas.
‘Então?’, perguntei, ‘O que você achou?’
‘Cara… É maravilhoso! Jamais imaginei isso. A maneira como os edifícios foram preservados e todas as coisas que eles encontraram durante todos esses anos… Você gostou? Aposto que você trombou em muitas pessoas enquanto sonhava e tirava milhões de fotos, não foi?’, ela piscou.
Ah! como eu amo essa minha amiga!
‘Não’, respondi fingindo estar ofendida e depois ri. ‘Você me conhece muito bem. Sim, trombei em algumas pessoas e em algumas paredes, mas nada grave. Este lugar é realmente incrível. Mal posso esperar para te mostrar minhas fotos e ver as suas. Posso roubar algumas? Você é tão criativa com fotos.’
Nossas pizzas chegaram e paramos de conversar por alguns instantes.
‘Ah!’, disse, ‘tem esse museu no caminho da estação de trem, que tem uma coisa em 3D. É como se fosse um passeio virtual por Ercolano e Pompéia, uma coisa multissensorial. Quer dar uma olhada antes de voltarmos para casa?’
‘Mdfsdfj’, ela tentou dizer alguma coisa, mas havia mordido uma enorme pizza.
‘Sua porquinha. Vou entender isso como um sim.’
No trem de volta – desta vez pegamos um Intercity, que foi mais rápido e só parou em quatro estações – decidi contar para a Lisa sobre o Luca.
‘Lisa, o Luca me enviou um e-mail essa semana.’
‘Sério? Só o Luca? Você tem sorte então. Os meus alunos me enviam e-mails durante a semana toda. Acho que eles pensam que eu só trabalho para eles.’
‘Não, Lisa, você não entendeu. Você se lembra do que te contei sobre o Luca? Aquele cara lindo, que me encara durante as aulas e que é sempre o último a sair da classe, e não sem antes me jogar beijos?’
‘Ah! O Luca? Sr. Alighieri Junior garanhão?’
‘O que você quer dizer com Alighieri Junior?’
‘Ah! Qual é? Não me diga que você não sabe?! Ele é filho do senhor Alighieri, como nos Alighieri, o proprietário da Alighieri.’
‘Não, eu não sabia! Como é que você nunca me disse isso?’
Ela estava vendo suas fotos e me deu de ombros.
‘Pensei que você soubesse… me desculpe.’
‘Ah, quer saber? Deixa pra lá, Lisa.’
‘Então? Conte tudo! Aquele gatão do Alighieri Junior enviando e-mails para você???’
‘Lisa! Shiuuu. Não fale o nome dele em voz alta, por favor.’
‘Ah, tá. Tá bom. Desculpa, ok? Agora me fale. Ele enviou apenas um e-mail ou foram mais e você só está me contando agora? Honestamente, Carolina, esperava mais confiança da sua parte.’
‘Lisa, por favor, pare com essa chantagem emocional! Estou falando sério. Ele me enviou mais de um, mas é com o último que estou preocupada. É por isso que estou tentando conversar com você. Aff…’
‘Então me conte. O que ele disse?’
‘Posso te mostrar quando chegarmos em casa, mas basicamente ele disse que nunca conheceu uma garota como eu, que gosta de mim e que gostaria de me chamar para sair. Ele me convidou para ir a Capri no sábado.’
‘O quê? Capri? Eu posso ir também? Ouvi dizer que Mick Jagger está sempre por lá. Adoraria encontrá-lo.’
A encarei, com cara de desaprovação.
‘Ops…’
‘Sim. Ops! Podemos nos concentrar um pouco no meu problema?’
‘Claro. Desculpa. Você sabe que às vezes me empolgo. Continue.’
‘Tá bom. Então, ele me enviou esse e-mail na quarta e na quinta-feira eu fiz de tudo para não cruzar com ele. Na verdade, estou pensando agora e estou um pouco intrigada… Por que ele não estava por lá na quinta-feira? Ele está sempre por perto quando termino minhas aulas. Até mesmo quando ele não participa.’
Lisa não podia esperar de tanta ansiedade.
‘Você ainda não respondeu para ele? O que você irá dizer? Você vai com ele para Capri? Vão só vocês dois? Uau! Isso é tão excitante, Carolina! Um namorado milionário, fins de semana em Capri… Quem sabe o que virá depois? Paris, Roma… Não, Roma é aqui do lado. Paris, Londres, São Petersburgo, Grécia, Mônaco…’
Encarei ela novamente e ela se calou.
‘Ops… de novo.’
‘Você é tão empolgada. Do jeito que está falando, você vai querer nos casar já no mês que vem’, dei risada.
‘Bem, você não me deixou terminar. Eu ia falar justamente do anel de diamante’, ela respondeu e caímos na risada novamente.
‘Mas então’, continuei, ‘ainda não sei o que vou responder. O que você acha? Você acha que Gwen e Carl se importariam?’
‘A-ha! Então você quer dizer que sim. Sabia!’, ela riu como uma criança que não é boa. ‘Carolina, Carolina. Você acha que eu não te conheço? Notei como você fala sobre ele. Além disso, isso pode ser uma ótima maneira de você se esquecer de vez daquele estúpido Jean!’
‘Bem, acho que você está certa. O problema é que eu meio que gosto dele. Não nutro sentimentos por ele. Quero dizer, ele é bonito – muito bonito, é engraçado e gosto do jeito que ele flerta comigo. Mas, de verdade, não sei. Ele parece um tanto imaturo. E o fato de ser tão rico…’
‘Mas que diabos há de errado com ele ser rico, mulher?’
‘Humm… Acho que não há nada de errado nisso. Mas então, olhe para mim, Lisa. Pareço com a namorada de troféu de um playboyzinho rico e mimado? Eu não sei…’
‘Vá, vá, não seja boba. Para mim, é tudo muito simples. Você levou um pé na bunda de um idiota. Tem um cara super gostosão te querendo, e embora você ainda não admita, você também está querendo. Para mim, está tudo tão claro quanto dois mais dois são quatro. Onde está o problema?’
‘É, acho que você tem razão. O que há de errado em se divertir um pouco, não é mesmo? Talvez eu descubra que ele não é tão imaturo quanto parece. Talvez eu até comece a gostar dele, quer dizer, romanticamente falando’, conclui.
‘Exatamente. Talvez você até comece a gostar dele. Como se fosse algo muito difícil de acontecer’, Lisa virou os olhos e suspirou. ‘E aí, o que vai fazer?’
‘O que você quer dizer? Fazer o quê?’
‘O quê? Oras, responder ao e-mail, falar que você vai a Capri com ele, perguntar mais da viagem, quem irá, blá, blá, blá.’
‘Vixi. Não tinha pensado nisso. Nossa, não tenho ideia. De qualquer maneira ainda não me sinto pronta para responder. Preciso refletir mais sobre isso.’
‘Mas Carolina…’
O trem estava chegando em Garibaldi e me perdi em meus pensamentos novamente. Eu realmente preciso pensar cuidadosamente sobre isso. Sempre fui muito cautelosa com tudo em minha vida.
Ai, Carolina, quando você irá relaxar?
(***)
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Beijão e inté a semana que vem!
Dani
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